TJES – Factoring – Direito de Regresso – Legalidade da previsão contida no negócio jurídico. Exegese dos arts. 295 a 297 do Código Civil

TJES – Factoring – Direito de Regresso – Legalidade da previsão contida no negócio jurídico. Exegese dos arts. 295 a 297 do Código Civil

(25.07.12)

A Sétima Vara Cível de Vitória/ES entendeu que é lícito o exercício do direito de regresso pela empresa de fomento mercantil desde que haja no contrato expressa previsão da reaquisição pela faturizada dos títulos levados a desconto caso os devedores apontados nas cártulas venham a se tornar inadimplentes, exegese dos arts. 295 a 297 do Código Civil. A decisão foi dada por meio de sentença em Embargos a Execução.

Processo nº 024.09.020936-2
Embargante: Carlos Alberto Ferreira Costa.
Embargado: Varanda Fomento Mercantil Ltda.
Embargos à Execução

S E N T E N Ç A

Vistos etc…

Cuidam estes autos de Embargos à Execução onde é embargante Carlos Alberto Ferreira Costa e embargado Varanda Fomento Mercantil Ltda., todos devidamente qualificados nos autos.

Alega o embargante, preliminarmente, ilegitimidade passiva, ausência de causa de pedir e falta de interesse de agir. No mérito, alega ausência de título executivo e excesso de execução sob alegação de: cobrança de títulos sem o deságio pago pela contratante-vendedora, juros moratórios a partir do vencimento do título, multa de 10% excessiva. Por fim, pleiteia a suspensão da ação executiva em apenso.

Impugnação aos embargos às fls. 339/364.

O embargante se manifesta sobre a impugnação as fls. 365/369.

Intimadas as partes sobre as provas que pretendem produzir, o embargante pugna pela produção de prova pericial contábil e a embargada pugna pela prova oral.

Designada audiência de conciliação, as partes não se compuseram.

Deferida prova pericial contábil por este juízo, as partes apresentaram quesitos e assistentes técnicos.

Nomeado Expert, este orçou seus honorários.

Intimado o embargante para depósito, o mesmo impugnou os honorários fixados pelo Sr. Perito, tendo sido a impugnação acolhida em parte e os honorários reduzidos, conforme decisão de fl. 414-verso.

Novamente intimado para depósito, o embargante impugnou os honorários fixados pelo juízo.

Pela derradeira vez intimado para depósito, cientificado expressamente de que sua inércia implicaria em perda do direito de produção da referida prova, o embargante não se manifestou.

Em resumo, é o relatório.

PRELIMINARMENTE:

DA ILEGITIMIDADE PASSIVA:

Argui o embargante sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da execução em apenso, todavia não lhe assiste razão.

Isto porque verifico no contrato de fomento mercantil firmado entre a embargada e a Gasforte Combustíveis e Derivados Ltda. que o embargante figurou como fiador no referido pacto, tendo corroborado a garantia com sua assinatura no verso das duplicatas juntadas aos autos (fls. 23/53 dos autos da execução em apenso). Vejamos:

“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVOS REGIMENTAIS NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO FIADOR E SÓCIO MAJORITÁRIO DA EMPRESA DEVEDORA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS REMUNERATÓRIOS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. LEGALIDADE. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA. AGRAVOS REGIMENTAIS PARCIALMENTE PROVIDOS. I. A prescrição, no caso, dos encargos acessórios, nos termos do art. 178, § 10, III, é a quinquenal. Dessa forma, a cobrança de tais encargos financeiros serão limitados aqueles aplicáveis até cinco anos antes do ajuizamento da ação (RESP n. 474.166 – SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJU de 14.04.2003; RESP n. 976.757 – SP, Rela. Mina. Nancy Andrighi, DJe de 03.08.2010). II. A nulidade da fiança não pode ser apontada pelo cônjuge varão subscritor, mas somente pela mulher, em razão da ausência de outorga (art. 239 do Código Civil de 1916). Legitimidade passiva do co-réu que se impõe. III. Ante a sucumbência recíproca verificada nos embargos à monitória, dividida e compensada a verba honorária, com saldo em favor da credora. lV. Agravos regimentais parcialmente providos. (Superior Tribunal de Justiça STJ; AgRg-EDcl-Ag 1.165.674; Proc. 2009/0049876-9; RS; Quarta Turma; Rel. Min. Aldir Guimarães Passarinho Junior; Julg. 05/04/2011; DJE 08/04/2011)” (grifei)

“APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ARTIGO 206, § 5º, INCISO I DO CCB. NÃO OCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO AVALISTA QUE TAMBÉM FIGURA COMO FIADOR CONTRATO REPRESENTADO PELA NOTA PROMISSÓRIA. RECURSOS IMPROVIDOS. Prescreve em 5 anos a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular, nos termos do artigo 206, § 5º inciso I do CCB. Se o avalista da nota promissória, também figura como fiador no instrumento particular garantido pelo referido título, sua responsabilidade não se extingue com a extinção da relação cambiária, não podendo se eximir da obrigação mormente se assinou o contrato também como devedor solidário. (TJ-MS; AC-Ex 2011.022697-6/0000-00; Campo Grande; Terceira Turma Cível; Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay; DJEMS 14/10/2011; Pág. 39)” (grifei)

Assim, é o embargante parte legítima para figurar no polo passivo da ação executiva, razão pela qual rejeito a preliminar arguida.

AUSÊNCIA DE CAUSA DE PEDIR e FALTA DE INTERESSE DE AGIR:

Sustenta o embargante ausência de causa de pedir da petição inicial da ação executiva, bem como falta de interesse de agir do exequente, alegando inexistência do direito de regresso quanto aos títulos negociados e inadimplidos e, consequentemente, inexistência de título hábil a embasar a execução.

Entretanto, entendo que se trata de matéria de mérito, que será analisado posteriormente.

Rejeito as preliminares.

MERITORIAMENTE:

Afirma o embargante, meritoriamente, ausência de título executivo ante a inexistência de direito de regresso por parte da exequente e excesso de execução sob alegação de cobrança de títulos sem o deságio pago pela contratante-vendedora, juros moratórios a partir do vencimento do título e não da citação e multa excessiva de 10%.

Pois bem, quanto à principal alegação meritória do embargante, qual seja, inexistência do direito de regresso quanto aos títulos negociados e inadimplidos, tenho que não lhe assiste razão.

Isto porque o contrato de fomento mercantil firmado entre as partes, é expresso em sua cláusula 8ª, parágrafos segundo e terceiro, ao prescreverem:

PARÁGRAFO SEGUNDO – na eventualidade de não liquidação dos títulos de créditos cedidos, será a CONTRATANTE, comunicada para cumprir a prestação constante no título no prazo de 24 (vinte e quatro 16:05:01s), sob pena de decorrido o prazo citado a serem aplicados sobre o crédito inadimplido pelo DEVEDOR os mesmos encargos moratórios previstos na cláusula 11, deste instrumento.

PARÁGRAFO TERCEIRO – para o exercício do direito de regresso contra os coobrigados pelo pagamento e encontrando-se a CONTRATANTE em mora no cumprimento de sua obrigação, o respectivo título de crédito será apontado no Tabelionato de Protesto, no prazo legal.

Neste sentido, corroborando o entendimento deste magistrado, a jurisprudência pátria assim se manifesta:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. DUPLICATAS MERCANTIS. CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL. Sentença que julga parcialmente procedentes os pedidos vazados no pórtico inaugural. Inconformismo da ré. Pretendida declaração de nulidade das cláusulas contratuais por serem flagrantemente abusivas e ilegais. Requerimento genérico que não foi delineado na peça contestatória. Magistrado a quo que entendeu ser aplicável o pergaminho consumerista no caso concreto, configurando-se o contrato sub judice como sendo de adesão. Impossibilidade, entrementes, de decretação de ofício da nulidade de todas as cláusulas sem pleito específico, sob pena de violação dos princípios da inércia e dispositivo. Ululante inovação em sede recursal. Enfoque obstado. Mérito. Contrato de fomento mercantil. Existência da cláusula de recompra dos títulos em caso de superveniente constatação de vícios presentes nas cambiais. Comprovação de que foram negociadas duplicatas sem lastro. Circunstância que ensejou a deflagração da presente ação de cobrança. Expressa previsão da reaquisição pela faturizada dos títulos levados a desconto caso os devedores apontados nas cártulas venham a se tornar inadimplentes. Legalidade da previsão contida no negócio jurídico. Exegese dos arts. 295 a 297 do Código Civil. Operação considerada como cessão de crédito. Instituto regulado pelo direito civil pátrio e que pode ser exercido independentemente de autorização do Banco Central. Pretensões rechaçadas. Arguida incidência de correção monetária a partir da citação. Dívida líquida e certa. Exigibilidade a partir do vencimento dos títulos. Inteligência do art. 397, caput, do Código Civil. Manutenção do decisum a respeito. Fixação conforme o INPC/IBGE. Provimento n. 13/95 da corregedoria-geral da justiça deste areópago. Condenação ao pagamento de multa de 1% sobre o valor da causa impingida em sede de aclaratórios. Inviabilidade de exclusão. Inconformismo interposto com manifesto propósito de rediscutir o mérito e de protelar a solução do litígio. Manutenção da penalidade imposta pelo juízo a quo. Ônus sucumbenciais. Provimento jurisdicional exarado em primeira instância que se manteve intacto. Demandante que obteve êxito na maior parte dos pedidos vertidos na exordial. Sucumbência recíproca. Pleito de majoração da verba honorária. Viabilidade de alteração do critério. Possibilidade. Estipêndio da vencedora mantido incólume, sob pena de incorrer-se em reformatio in pejus. Recurso conhecido em parte e parcialmente provido. (TJ-SC; AC 2010.029787-9; Indaial; Quarta Câmara de Direito Comercial; Rel. Des. José Carlos Carstens Köhler; Julg. 04/10/2011; DJSC 18/10/2011; Pág. 145)” (grifei)

Ademais, em se tratanto de contrato de fomento mercantil, prescindível a causa subjacente que gerou a emissão dos títulos executivos, como no caso dos autos, sendo as duplicatas plenamente executáveis, conforme entendimento do C. STJ:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CHEQUE PRESCRITO EMPRESA DE FOMENTO MERCANTIL. FACTORING. CAUSA ORIGINÁRIA DA EMISSÃO DE CHEQUE. DEMONSTRAÇÃO DISPENSA. AUTONOMIA DOS TÍTULOS DE CRÉDITO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I – Nas demandas de cobrança de cheques prescritos para as ações cambiais, é prescindível que o autor decline a causa subjacente da emissão das cártulas, cabendo ao réu, se quiser, fazê-lo na oportunidade de apresentação de sua defesa. II – Recurso Especial provido. (Superior Tribunal de Justiça STJ; REsp 1.270.885; Proc. 2011/0196022-0; SC; Terceira Turma; Rel. Min. Massami Uyeda; Julg. 04/10/2011; DJE 11/10/2011)” (grifei)

Neste sentido, ante a o princípio da autonomia dos títulos de crédito, tenho as duplicatas que instruem a execução em apenso, documentos hábeis a embasar o pleito executivo, conforme previsto na Lei 5.474/68.

No que tange ao argumento autoral de excesso de execução, outra sorte não assiste ao embargante.

Como se infere dos autos, os reclamos do autor dizem respeito as cobranças abusiva feitas pela empresa embargada, razão pela qual requereu prova pericial para comprovar o alegado. No entanto, mesmo com a redução dos honorários periciais, o embargante não procedeu ao deposito a fim de ver a prova realizada.

É regra básica do sistema probatório a de que quem alega um fato deve prová-lo. No caso do embargante, os fatos que lhe incumbe provar são os que forem constitutivos do seu direito, nos termos do art. 333, I, do Código de Processo Civil.

Sobre o tema, elucidativa é a lição de Humberto Theodoro Júnior, in “Curso de Direito Processual Civil, volume I – Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento -, editora Forense, Rio de Janeiro, 39ª edição, página 376:

“Para o processo, a prova, como ensinava o grande João Monteiro, não é somente um fato processual, mas ainda uma indução lógica, é um meio com que se estabelece a existência positiva ou negativa do fato probando, e é a própria certeza dessa existência. A um só tempo, destarte, deve-se ver na prova a ação e o efeito de provar, quando se sabe, como Couture, que ‘provar é demonstrar de algum modo a certeza de um fato ou a veracidade de uma afirmação’.”

No mesmo sentido Carnelutti, lembrado por Moacyr Amaral Santos:

“Quem expõe uma pretensão em juízo deve provar os fatos que a sustentam; quem opõe uma exceção deve, por seu lado, provar os fatos dos quais resulta; em outros termos, quem aciona deve provar o fato ou fatos constitutivos; quem excetua o fato ou fatos extintivos ou condições impeditivas ou modificativas”. (in Comentários ao CPC. vol. IV, 1977).

Neste caso, muito embora tenha sido requerida e deferida a prova pericial, a parte autora quedou-se inerte quanto ao depósito dos honorários periciais, precluso portanto, o seu direito a produção da referida prova, desnecessária a intimação da parte para tal finalidade.

Neste sentido trago a colação, recente manifestação de nosso Egrégio Tribunal de Justiça:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NA APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL CONHECIDO COMO AGRAVO INTERNO. FUNGIBILIDADE RECURSAL. PROVA PERICIAL. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. INTIMAÇÃO PESSOAL DAS PARTES. DESNECESSIDADE. PRECLUSÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. I. Embora descabido o recurso de agravo regimental em face de decisão monocrática que negou seguimento ao recurso de apelação, uma vez devidamente tempestivo, o mesmo deve ser conhecido como agravo interno, na forma do artigo 557, §1º, do código de processo civil, com base no princípio da fungibilidade recursal. II. A despeito da alegação dos recorrentes no sentido de que não depositaram os honorários periciais, por ausência de intimação pessoal, em virtude de que esta teria sido direcionada a endereço incorreto, certo é que a determinação judicial para o mencionado depósito, independe de intimação pessoal da parte postulante, bastando que seja feita na pessoa de seus procuradores, o que, frise-se, foi, por 02 (duas) vezes, realizado nos autos, conforme infere-se das certidões cartorárias de fl. 47 e fl. 57. Precedente STJ. III. Recurso improvido. (TJ-ES; AGInt-AC 24970157772; Segunda Câmara Cível; Rel. Desig. Des. Namyr Carlos de Souza Filho; DJES 14/09/2011; Pág. 55)” (grifei)

É como entendo, sendo desnecessárias, por supérfluas, outras tantas considerações.

Isto posto, e por tudo o mais que dos autos consta, com fulcro no artigo 269, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NOS PRESENTES EMBARGOS A EXECUÇÃO.

Condeno o embargante nas custas processuais e honorários advocatícios que ora arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído a execução, devidamente corrigido na forma da lei a partir do proferimento desta sentença.

Prossiga-se na execução.

Junte cópia da presente decisão nos autos da execução em apenso.

Publique-se.
Registre-se.
Intime-se.

Vitória/ES, 29 de maio de 2012.

Marcos Assef do Vale Depes
Juiz de Direito